Ostomizados de Friburgo precisam de ajuda.

 

 

 

Dra. Tania Lima

A Dra. TANIA LIMA É NOSSA COLUNISTA DESDE JULHO DE 2007

- Doutoranda do setor de Proctologia do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina da UFRJ.
- Mestre em Enfermagem pela Escola de Enfermagem Anna Nery / UFRJ.
- Diretora Técnica da Clínica By Care - Consultoria e Assistência em Estomaterapia.
- Membro do Conselho Editorial da Revista Estima (Veículo Oficial de Comunicação da Sociedade Brasileira de Estomaterapia, ostomias, feridas e incontinências).
- Enfermeira Estomaterapeuta do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho / UFRJ.
TANIA DAS GRAÇAS DE SOUZA LIMA

 

 

 

"A irrigação tem como indicação as colostomias localizadas no

cólon esquerdo ( sigmóide ou descendente )..."

A Dra. Tania Lima é Diretora Técnica da Clínica By Care.
Telefone (21) 2255-5140, e-mail  by.care@terra.com.br.

 

 

 

 

 

 

MÉTODO DE IRRIGAÇÃO E SISTEMA OCLUSOR

 

 

1) - Introdução.

 

Embora, na maioria das vezes, a confecção das ostomias busque salvar vidas, estas comportam inúmeras dificuldades que impõe outros problemas adicionados à pessoa ostomizada. Essas dificuldades, inúmeras e variadas, dizem respeito à aceitação das mudanças de imagem corporal, do estilo de vida, do relacionamento social, do desempenho de papeis e da sexualidade. Sobretudo a colostomia definitiva pode produzir transtornos psicológicos e sociais, muitas vezes difíceis de superar.

 

Nesse sentido cabe ressaltar que vivemos numa sociedade em que se cultua o corpo belo e que se valoriza extremamente a boa aparência e o controle de odores, através de fragrâncias, desodorantes e outras medidas, não tendo então espaço para o feio, o mau cheiro, a eliminação de gases ou para o uso de uma bolsa sobre a pele do abdômen onde ocorre o depósito de excretas. Diante disso, o cliente ostomizado sente-se temeroso quanto à possibilidade de eliminação de odores desagradáveis, bem como que os outros possam perceber que ele esta fazendo uso de uma bolsa coletora ou algo similar.

 

Colaborando com a citação acima, estão os comentários de ZERBETO (1987) acerca de insegurança, medo e angustia gerado pela criação do estoma e de FERNANDEZ (1992), ao apontar a insegurança e o medo como determinantes da necessidade de ajuda para o enfrentamento relativo à alteração de sua imagem corporal.

 

A incapacidade de controle da evacuação de fezes, gases, ruídos e odores desagradáveis que acompanham uma ostomia de eliminação, sobretudo quando confeccionada no intestino grosso, comportam para a pessoa ostomizada, inúmeras dificuldades para o seu convívio e reabilitação.


Enfatizam esses comentários às afirmações de SANTOS (1989), ao referir-se às alterações da auto-estima e imagem corporal do ostomizado que levam a um conjunto de problemas psicológicos e sociais e, ainda, os relatos de GOLIGUER (1996), ao apontar como motivo para preocupação dos clientes colostomizados, a saída involuntária de gases, podendo causar embaraços pelo barulho que faz e o mau cheiro exalado.

 

Ainda segundo BOCCARDO et al (1995), o estoma é muitas vezes o custo da saúde para o individuo, exigindo que ele desenvolva processo de reconstrução de identidade pessoal e reformulação de sua imagem corporal. Nesse sentido um aspecto fundamental, focalizado pelos mesmos autores no estudo com 45 clientes portadores de estomas urinários e intestinais, é a atividade sexual e o quanto esta é prejudicada pela confecção de um estoma, seja por problemas físicos ou psíquicos relacionados a auto-imagem, a qualidade do dispositivo ou ainda pela rejeição do(a) parceiro(a).

 

Tem sido preocupação constante dos profissionais de saúde, as modificações causadas pelas cirurgias resultantes em ostomias e suas conseqüências na reabilitação, e assim várias pesquisas realizadas a fim de se buscar meios para tornar os estomas continentes. Inúmeros autores têm discorrido sobre o interesse crescente pelo aprimoramento das técnicas operatórias que conservam o sistema esfincteriano para o tratamento de diferentes afecções, como neoplasias, doenças inflamatórias ou traumatismos, objetivando-se evitar a feitura de uma colostomia definitiva.


Segundo GOLIGUER (1990), varias técnicas foram perseguidas a fim de se obter controle local para o escape de fezes e gases, como a construção de válvula mamilar, desnervação do colo esquerdo, tampa magnética, tampa metálica, controle através de implante de coxim inflável, transplante da camada muscular autóloga do colo.

 

SANTOS (1992) refere à utilização de métodos alternativos como o natural, operações que retardam o transito intestinal, o condicionamento físico, a irrigação e a utilização de dispositivos oclusores, com o objetivo de controlar a função intestinal no colostomizado.

 

Quanto às operações que retardam o transito intestinal, sejam aquelas em que se faz a implantação de um anel muscular no estoma, ou as técnicas de angulação e desnervação colônica, todas foram acompanhadas de complicações quais sejam infecciosas, dificuldades técnicas e a necessidade de um enema para estimular a evacuação e, portanto abandonadas.

 

Sobre o condicionamento psicofísico, segundo a mesma autora, o método baseia-se na utilização da contração da musculatura abdominal para o controle das eliminações intestinais. Porém, pela necessidade de outros estudos comprobatórios sobre os aspectos psicológicos apontados como causadores dos resultados negativos, também não é utilizado.

 

Referindo-se então ao cliente colostomizado, entendendo-se como reabilitação a maneira bem sucedida deste adaptar-se às modificações decorrentes de confecção da colostomia. E, portanto a capacidade de exercer funções da vida cotidiana interagir com o grupo familiar e grupo social pertencente e o exercício profissional. Cumpre ressaltar que a adaptação citada requer um conjunto de mudanças nos hábitos de vida diária, o qual deverá contemplar uma gama variada de aspectos relativos aos cuidados específicos com a ostomia e região periestomal no sentido de alcançar a segurança e o bem estar necessário à manutenção da qualidade de vida.

 

Apesar de serem ainda sub-utilizados em nosso país o método de irrigação e o sistema oclusor são procedimentos não cirúrgicos, de caráter não invasivo, desprovidos de riscos e que pela facilidade de uso tem sido considerados excelentes alternativas na busca da reabilitação em colostomizados.

 

 

2) - O Sistema oclusor e o método de irrigação.

 

 

Dos dispositivos descartáveis, o sistema oclusor ou obturador da colostomia denominado Conseal, representou um avanço bastante importante no controle da incontinência intestinal em colostomizados, podendo ser utilizado isoladamente ou em associação à irrigação. Foi desenvolvido em 1984, através de estudo multicêntrico nos paises escandinavos por Burchart e colaboradores.

 

 

Sistema oclusor de 1 peça
Fig.1 - Sistema oclusor
de uma peça

Consiste em um dispositivo tipo tampão, descartável, flexível, disponível em uma ou duas peças, usado para ocluir a colostomia, possibilitando o controle da eliminação de fezes e gases.

O sistema de uma peça que pode ser observado na figura na Fig. 1 consiste em um disco o qual é formado por um adesivo protetor e o oclusor propriamente dito, configurando um elemento único.
O sistema possui, ainda, um filtro de carvão ativado para a eliminação dos gases sem ruído e odor, apresenta-se pré-cortado, pronto para uso, em dois tamanhos, de 35 e 45 mm de comprimento; para medidas distintas de estoma de 20mm a de 35mm e de 35 a 45 mm de diâmetro, respectivamente.

 

 

O adesivo protetor é formado por um adesivo de terceira geração, para fixação na pele ao redor do estoma e o oclusor de um cilindro suave e flexível, fabricado em espuma de poliuretano – esta espuma é macia e flexível a fim de ser inserida e removida confortavelmente, possui cerdas abertas e apresenta-se comprida e envolta em uma película de álcool polivinil. Esta película permite uma fácil inserção dentro da colostomia, é solúvel em água, dissolvendo-se aproximadamente em 30 segundos após sua aplicação, promovendo a expansão da espuma de poliuretano até o seu tamanho natural e final (2,6 cm de diâmetro distal), gerando a oclusão da luz intestinal. Para facilitar a introdução, o obturador esta lubrificado com etilenoglicol, um gel lubrificante.

 

A escolha do tamanho ideal deve ser embasada em dados antropométricos, como peso e altura; estes nos oferecem subsídios relativos à espessura da camada de gordura da parede do abdome.


CERDAN et al (1990), a partir de estudo desenvolvido com 20 clientes, sendo 13 homens e 7 mulheres, conclui que o obturador, enquanto sistema continente, é de fácil uso e contribui para a melhoria da qualidade de vida do colostomizado, alem de ser desprovido de efeitos secundários.

 

 

Sistema oclusor de 2 peças
Fig.2 - Sistema oclusor
de 2 peças

Quanto ao sistema de duas peças, seus elementos principais, isto é, o adesivo protetor e o obturador propriamente dito, se encontram separados, configurando um sistema similar ao da bolsa coletora de 2 peças.

O adesivo protetor constitui-se de disco ou placa flexível e adesiva, formada por barreira protetora de carboxiimetil-celulose e adesivo microporoso ao redor da placa que reforça sua segura ça e adesividade com o objetivo de manter-se à pele durante 4 a 6 dias.

 

 

Quando o método de irrigação através da colostomia, esta é uma técnica de limpeza mecânica para o controle das excreções intestinais, realizada de forma programada a cada 24, 48 ou 72 horas, cujo liquido, enviado ao intestino grosso através do estoma, estimula a peristalse em massa e, assim, o esvaziamento do conteúdo fecal.

 

ROGENSKI (1999) conceitua ainda a irrigação como método mecânico que permite o esvaziamento do cólon, controlando sua funcionalidade e eliminando, em muitos casos, a necessidade do uso de bolsas coletoras.

 

Foi mencionado pela primeira vez na literatura por PILLORE e FINE, no século XVIII, como meio de controlar a passagem de fezes e gases pelo estoma. Porém, somente a partir de 1927, quando foi citado pela literatura inglesa por LOCKHART – MUMERY, despertou grande interesse, sendo amplamente aceito na Inglaterra. Posteriormente, com as publicações dos trabalhos de GABRIEL (1945) e DUKES (1947), acerca das complicações graves por perfurações intestinais pelo uso de sondas retais, a técnica foi praticamente abandonada em toda Europa.

 

 

Peças usadas na irrigação
Fig.3 - Sistema ou aparelho
de irrigação

A partir de 1950, com a utilização de equipamentos apropriados e com o aprimoramento dos dispositivos próprios, principalmente pela substituição da sonda retal por um cone, maleável além do surgimento da Estomaterapia, é que o método passou a ser amplamente utilizado nos EUA.

O sistema ou o aparelho de irrigação consiste em uma bolsa plástica, graduada, transparente, com um dispositivo regulador da temperatura e tubo conector, acoplado a extremidade cônica maleável e pinça de controle de fluxo de água; manga drenável, transparente para fixação em anel avulso ou placa protetora e cinto elástico ajustável à manga.

 

 

No Brasil, mesmo com a publicação de alguns trabalhos acerca dos resultados obtidos com uso do método da irrigação, ainda faz-se necessária maior divulgação para incrementar sua utilização.Ao analisar essa situação na pratica diária, observo como fatores limitantes o pouco conhecimento do método por parte dos profissionais de saúde e a própria carência de estomaterapeutas.

 

HABR-GAMA et al (1999) questionam quanto ao baixo índice de indicação do método a ser motivado pela falta de divulgação por parte dos médicos, pelo despreparo das enfermeiras ou pelo desinteresse dos clientes.

 

A irrigação da colostomia, assim como o sistema oclusor, tem como indicações os clientes portadores de colostomias esquerdas, terminais (confeccionadas no cólon descendente ou sigmóide) ou dupla boca, estomas visíveis, com condições físicas para realizarem o autocuidado e condições básicas de saneamento em suas residenciais.

 

A partir do exposto podemos mencionar como contra-indicações os portadores de colostomias confeccionadas no cólon transverso ou ascendente, as ostomias de intestino delgado, com complicações, tais como hérnias paracolostomicas volumosas. Prolapso e estenoses, e as incapacidades para o auto cuidado como deficiência mental e/ou visual, senitude e alterações osteoarticulares.

 

O método tem inúmeras vantagens, conforme citam SANTOS & KOIZUMI (1992) em trabalho realizado com quarenta colostomizados, em que observam que 35,7% dos clientes não apresentam perdas fecais nos intervalos das irrigações, 42,5% apenas esporadicamente e 27,5% não apresentam a eliminação de gases, enquanto 35% os eliminavam em menor quantidade.


Corroborando com tais dados, encontramos as citações de REY (1994) relativas às vantagens do método de irrigação quanto à capacidade de regular as eliminações, a possibilidade de ingerir uma dieta mais variada, o aumento da confiança, segurança e auto-estima e a facilitação das relações pessoais.

 

As vantagens da utilização do método da irrigação não se detém apenas nas respostas quantitativas relativas as fezes, gases, ruídos e odores.

 

Segundo LIMA (2001), em um trabalho realizado com 25 clientes colostomizados, concluiu que 100% da amostra referiram ser fácil sua colaboração, 80% usariam o oclusor em substituição a bolsa coletora e 92% relataram sentimentos de segurança, tranqüilidade, liberdade e despreocupação. O mesmo autor descreve ainda satisfação da clientela, sensação de normalidade e melhoria das relações sociais em decorrência da maior segurança e menor ansiedade, retorno às atividades de lazer, trabalho e, ainda a redução das restrições alimentares.

 

Em relação às desvantagens, embora sejam poucos os trabalhos que as abordam, encontramos as referências de REY (1994) que cita como inconvenientes ser um processo lento, a possibilidade da persistência da incontinência dos gases, perdas fecais e irritação cutânea, a necessidade de aprendizagem e adaptação ao sistema e o seguimento da utilização da bolsa coletora, diferentes tipos de curativos ou obturador; para WINKLER, citado por HABR-GAMA (1999), se realizada corretamente, as desvantagens ligadas à irrigação são insignificantes.

 

Corroborando com nossas citações, encontramos os comentários de RIATTI (1998), que tendo realizado um estudo em 1992, com cem pacientes ostomizados, em quatro centros na Lombardia/Itália sobre o impacto da irrigação em suas vidas, obteve os seguintes resultados: 87% foram a favor do método porque ele restituiu sua dignidade e facilitou suas vidas; 60% continuaram a usar uma pequena bolsa por receio de ter alguma perda durante a noite, ou antes, da próxima irrigação; e 35% dos pacientes observavam uma melhora em suas relações íntimas.

 

Ainda segundo LIMA (2001), quanto ao método de irrigação associado ao sistema oclusor, observou que 88%realizaram a cada 48 e 12% com muita periodicidade de 72 horas. Quanto à perda de fezes durante intervalos de realização dos métodos propostos, 48% nunca observaram esta ocorrência e 36 % excepcionalmente. Em relação à eliminação de gases, 32% nunca perceberam e 68% observaram esta ocorrência, porém sem odor ou ruído e em menor quantidade do que ocorria anteriormente.

 

 

3) - Conclusão.

 

 

Podemos então concluir que a irrigação da colostomia e o sistema oclusor são métodos simples, práticos e seguros, por não impingir nenhuma agressão aos clientes, proporcionando-lhes melhora no padrão de vida e em conseqüências auxiliando-os no processo de reabilitação, sobretudo pela possibilidade de obtenção de um período maior de continência para fezes, diminuição de eliminação de gases, ruídos e odores, melhoria da imagem corporal e das relações interpessoais.

 

Por essas considerações, os métodos propostos tornam-se alternativas perfeitamente viáveis na busca da continência intestinal, capazes de proporcionar segurança, tranqüilidade e minimização da ocorrência de dermatites, além de opções de extrema relevância por serem consideradas de custo relativamente baixo e fácil aplicabilidade, após treinamento por estomaterapeuta.

 

 

Oclusor aplicado ao abdômen
Fig.4- Sistema oclusor

A importância da utilização desses métodos relaciona elementos que se traduzem na possibilidade do cuidar em enfermagem e constituem-se estratégias praticas ainda sub-utilizadas. Cabe ao enfermeiro estomaterapeuta assumir para si o papel de partícipe de fundamental relevância na equipe interdisciplinar, quando na prática do seu cotidiano, não se restringindo apenas a assistir, mas instrumentalizando-se em busca de conhecimento e exercitando em sua plenitude o cuidar deste tão singular cliente portador de uma ostomia intestinal de eliminação.

 

 

Publicação: 09/08/2007.


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Esse Material é produzido pelo Engº Spencer Ferreira, portador da Doença de Crohn e da condição definitiva de ileostomizado.
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